terça-feira, 22 de setembro de 2009

“O medo dos franceses”

Um pequeno “tour” em francês, um grande passo para Alexandra!

Antes de começar o Verão, uma colega guia propôs-me fazer uma visita guiada para um grupo de turistas franceses e, como já estava na hora de começar, aceitei. Afinal, tratava-se apenas de uma pequena volta pela cidade de Lisboa…
Amedrontada mas também determinada, entreguei-me à demanda de uma melhor performance em língua francesa: dediquei uma semaninha inteira a estudar o idioma dos “gaulois”. Exercícios à frente do computador com headphones, leituras encenadas à frente da mãe, dos irmãos e do espelho… A repetição é fundamental! E ver TV em francês também ajuda bastante…
Todo o esforço valeu a pena! As melhoras eram notáveis de dia para dia… E assim, no dia 8 de Junho à tarde, lá fui eu, preparada, para o Cais da Rocha Conde d’Óbidos.
O percurso da visita foi do mais comum possível: saímos do cais, fomos para a Torre de Belém, Jerónimos, panorâmica da cidade de Lisboa e Alfama. Mas, mesmo assim, quando entrei no meu autocarro cheio de franceses sorridentes, avisei-os de que aquele era o meu 1º “tour” na sua língua. Disse-lhes bem que o meu francês não era perfeito. Iria dar o meu melhor, com a plena convicção de que me desenrascava pois tinha treinado durante longas horas. Surpreendentemente os “meus” turistas receberem esta notícia com grande generosidade e educação, ajudando-me a esquecer um pouco do meu nervosismo.
Começámos a visita.
O texto estava muito bem estudado, por isso saiu-me muito bem, contudo outras dúvidas e conversas entre guia e cliente já se tornavam mais difíceis.
Terminada esta enorme prova, dou por mim a pensar. Será que os turistas franceses são mesmo exigentes como se diz no mundo dos guias-intérpretes? Será que tive sorte e trabalhei com um grupo educado e compreensivo? No final, fiquei com a convicção de a minha sinceridade, e provavelmente a minha simpatia, os terão conquistado e como forma de agradecimento presenteei-os com “un petit cadeau”: um marcador de livros com a Sé de Lisboa (um quadro do meu pai) e um pequeno texto em francês.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Castelo de Torres Vedras

Bem-vindos a Torres Vedras!

Bem-vindos a Torres Vedras!

Uma das coisas que deve dar mais prazer a um guia é partilhar o seu conhecimento e perceber que o público ao qual se dirige está a gostar, não só das palavras, mas do que está a ver. É o que sinto e só trabalho há uns meses.
Então começo por vos apresentar a minha cidade, Torres Vedras! Foi aqui que nasci e é por isso que esta odisseia começa justamente por dar a conhecer o meu berço.

Torres Vedras é cidade há 30 anos. Pouquíssimo tempo… Mas não nos deixemos enganar, porque esta tão jovem cidade tem uma grande história, que merece ser contada. Começa na pré-história, passa pelo período visigótico, árabe e, finalmente, cristão.

Sabiam que Torres (como nós torrienses lhe chamamos) foi a primeira escolha de D. João III para transferir a Universidade (que hoje está em Coimbra)?

Não nos esqueçamos também das defesas das linhas de torres, aquando das invasões francesas que grande papel tiveram na defesa da capital.

Se "olharmos" para a actualidade, percebemos que Torres é, hoje, uma cidade muito dinâmica. Os eventos que animam a cidade misturam tradição e modernidade, arte e lazer, animação e bem-estar... São disso exemplos a feira rural, o Carnaval, a festa da juventude, as festas da cidade.

E há ainda a gastronomia!
Os tradicionais pastéis de feijão, a pêra rocha, os pratos de carne como o cabrito no forno, ensopados de cordeiro, sempre acompanhados de um bom vinho da região.


Espaços a visitar em Torres Vedras:
- O Castelo
- Igreja de Santa Maria do Castelo
- Casa do Castelo
- Paços do Concelho
- Chafariz dos Canos
- Igreja de S. Pedro
- Ruas pedonais
- Praça 25 de Abril, conhecida como Jardim da Graça
- Igreja e Claustros da Graça
- Fábrica dos Pastéis de Feijão

Comecemos a nossa visita no “Largo da Graça”, oficialmente chamado largo 25 de Abril, onde se encontra o Obelisco comemorativo das batalhas realizadas aquando das invasões francesas – Buçaco, Vimeiro, Roliça e Torres Vedras.
Temos a sul a Igreja e convento da Graça, que hoje alberga o Museu Municipal Leonel Trindade, enquanto que a norte está a Praça da República, o posto de Turismo e o primitivo burgo.

Igreja de Nª Sr.ª da Graça:
A igreja e convento de Nª Sr.ª da Graça foram construídos no séc. XVI e apresentam um estilo maneirista. Um estilo muito típico do tempo dos Filipes, que se caracteriza por apresentar uma fachada simples e limpa de decoração e um interior mais enfeitado, por ser a casa de Deus. Ora este convento foi construído pelos frades eremitas calçados de Santo Agostinho para substituir um outro que estava na zona baixa da cidade e que sofria muito com as cheias.
Este convento albergava os frades agostinhos, uma ordem de clausura que se dedicava ao estudo, à escrita e neste caso, aliado a um hospital especializado nos cuidados de leprosos.
Antes de entrarmos na igreja passamos por uma galilé (que é um alpendre de uma igreja), cujas paredes estão cobertas, até meio, por azulejos albarradas (representam grandes jarras cheias de flores e estão muitas vezes ladeados por aves) do século XVIII. Do lado direito do portal da igreja está a portaria do convento e se tivermos a oportunidade de entrar, descobriremos mais um conjunto de azulejos, mas desta vez que representam a vida de S. Gonçalo de Lagos (1378-1422), o primeiro prior deste convento e patrono da cidade desde 1495. Mas estes não são os únicos azulejos historiados do século XVIII aqui plantados, pois há outros como os dos claustros, do cemitério, da sacristia e da ante-sacristia.
Entrando na igreja observaremos um templo de uma só nave coberta por uma abóbada de berço. Na capela-mor está um retábulo de talha dourada do século XVII com uma imagem de Nª Sr.ª da Graça e os fundadores da ordem, Santo Agostinho e Santa Mónica. Mas antes de chegarmos ao altar estão várias capelas laterais ao longo da nave. Assim, do lado esquerdo estão a capela do Sr. dos Passos, o altar de Santa Rita de Cássia e a capela de S. Gonçalo de Lagos onde estão algumas das suas relíquias; do lado direito as capelas da Sr.ª da Natividade, da Sr.ª da Correia e da Sr.ª das Dores e ainda o nicho que guarda os restos mortais de S. Gonçalo de Lagos.
O convento funcionou até 1834, aquando da extinção das ordens religiosas e foi comprado pela Câmara Municipal em 1887 e hoje é palco do museu municipal. A igreja continua aberta ao público e ao culto religioso.

Museu Municipal Leonel Trindade:
O museu foi inaugurado em 1929 numa sala anexa à igreja de S. Pedro, só em 1944 passou para a antiga sede da Irmandade da Misericórdia e só em 1989 é transferido para o convento da graça. Tratava-se de um museu dedicado à arte antiga, mas hoje pode classificar-se como museu arqueológico.
Aqui encontramos uma exposição de objectos pré-históricos com base nos vestígios arqueológicos de um castro encontrados no Zambujal; outros objectos de artilharia, fotografias, documentos e maquetas referentes às linhas de torres e ainda uma outra parte, mais ligada à arte medieval, da qual pertencem as pinturas que estavam na igreja de Santa Maria do Castelo e algumas pedras tumulares.

Caminhe na direcção do hotel império. Encontra-se numa das praças centrais de Torres Vedras e junto dos cafés mais antigos e frequentados: O café império e a Havanesa (pode aproveitar que aqui está para tomar 1 café e provar um pastel de feijão – que é tradicional nesta cidade).
Se estiver parado no centro da praça virado para a Havanesa e olhar para a sua direita vai ver uma porta grande de madeira, se olhar para a sua esquerda, ao fim da rua Paiva de Andrade, encontra uma outra porta igualzinha:

5 Portas:
Há cinco destas portas pela cidade e quando abertas apresentam estações da procissão do Sr. dos Passos (5 das 12). Destas 5 portas há 3 que sobressaem pela importância, pois são as que correspondem às entradas da cerca medieval da então vila de Torres Vedras.
As 3 portas da muralha localizam-se em três sitos estratégicos: a 1ª está ao lado do chafariz dos canos. Por esta porta entravam os que faziam o caminho medieval Lisboa – Sintra - Torres Vedras – Lourinhã – Óbidos – Caldas da Rainha, assim como os peregrinos que se dirigiam a Santiago de Compostela. Este local era de todo conveniente já que mesmo ao lado está o chafariz que dava de beber aos cavalos e outros animais trazidos nessas andanças. É importante notar que sem água era impossível continuar a viagem. A 2ª é a Porta da Várzea, que se encontra ao fundo da rua Paiva de Andrada. A porta de Santa foi demolida em 1641 e estava onde é hoje o jardim da graça e encontra-se hoje na rua da antiga judiaria, mesmo em frente ao bar “O celeiro”.

Descemos então a rua e viramos à direita, na rua Dr. Aleixo Ferreira e seguimos por essa rua, passando pela Praça Machado Santos, antiga praça da batata. Hoje encontramos neste local algum movimento atraído pela livraria “Livro do Dia” e pela igreja onde se realizam as actividades religiosas junto da comunidade. É ainda um espaço com grande actividade durante o Carnaval, sendo palco de alguns concertos ao vivo.
Quanto ao nome “praça da batata” não esconde grande segredo, este nome é dado porque nela se realizava uma feira de batatas e outros legumes secos. Viramos à esquerda na rua do Terreirinho e logo depois à direita na rua dos cavaleiros da espora dourada e continuar em frente até às escadinhas do castelo.
Ao subir as escadinhas do castelo vai com certeza reparar que uma parte da escadaria é recente enquanto que outra já vem de tempos mais remotos, o que nos prova a longa idade deste burgo. Este caminho leva-nos ao Castelo:

O castelo:
Antes de entrar no castelo observamos o portal, simples, mas nem por isso menos belo. Este portal apresenta-nos um arco gótico (ogival), encimado por 2 esferas armilares, 2 cruzes da ordem de Cristo e o escudo de armas de D. Manuel. Todas as pistas levam-nos a concluir que se trata de um portal quinhentista do reinado de D. Manuel. Todavia a história deste castelo começa muito antes. Esta colina já foi habitada por romanos, suevos, visigodos e do século VIII ao XII foi habitado por mouros. E foi o seu castelo que foi invadido e conquistado por D. Afonso Henriques em 1148.
Ao entrarmos pelo portal manuelino passamos pela praça de armas e depressa vamos encontrar à nossa direita uma escadaria que nos vai levar à Igreja de Santa Maria do Castelo. Esta Igreja foi aqui implantada sobre uma antiga mesquita, sob ordem do rei D. Afonso Henriques.
Continua a subir em direcção ao castelejo, antiga residência do Alcaide-mor da vila, e vamos encontrar várias estruturas românicas: como o caminho de ronda, a alcáçova, o cemitério medieval (há algumas lápides tumulares numa Câmara por dentro da torre e no museu municipal Leonel Trindade). Ao castelo medieval acresceram-se alguns sistemas de defesa adequados às técnicas de batalha do séc. XIX, aquando da defesa das linhas de torres – este castelo foi palco de uma batalha liderada pelo Duque de Saldanha. As ruínas que aqui vemos são o resultado dos estragos provocados pelo terramoto de 1755 e dos bombardeamentos do marechal Saldanha em 1846.

Para além do 1º rei português outros demonstraram grande apreço pela vila e pelo castelo, tais como D. Dinis que ampliou o castelo, D. Fernando que alargou as muralhas, D. Manuel que deu à vila um novo foral e D. João III que para aqui queria transferir a universidade (que acabou por ir para Coimbra)
Saindo do castelo vemos à nossa frente a antiga Alcáçova, ou paço real, onde em 1413 e que é o hoje a “casa do castelo”, um espaço dedicado à cultura e ao lazer, no qual podemos às 6ªs e Sábados assistir a concertos ao vivo e tomar umas bebidas.
Seguimos então para a esquerda, para a rua Capitão Luís B. Pimentel que nos leva até à adega e restaurante “O manadinhas”, onde a comida é tradicional portuguesa, recomendável e de preço acessível. Continuando em frente e passando pelo antigo largo do grilo e seguindo pela rua Mouzinho de Albuquerque chegaremos até ao Chafariz dos Canos.

Chafariz dos Canos:
Monumento Nacional, desde 1910, o chafariz terá sido construído antes de 1331 (talvez até durante o reinado de D. Dinis) e é um monumento único dentro do estilo gótico, não só em termos arquitectónicos, mas também em termos simbólicos. Embora haja um grande enigma por trás da sua origem, quem o terá mandado construir e porquê? Sabemos que se trata do monumento gótico, com acrescentos do século XV – os cones torsos e as ameias.
O fontanário é composto por 5 arcadas, compostas cada uma por 3 arcos ogivais, assentes em capitéis de decoração vegetalista. Em 5 faces do polígono (já que uma está encostada à parede, encontramos 4 gárgulas (a 5ª está no … da igreja de S. Pedro) e nas colunas que separam as faces 4 brasões, 2 da cidade e 2 de D. Dinis. Para além desta clara evidência dada pelo brasão, se olhar com mais atenção para um pormenor dos capiteis, uma das decorações claramente visíveis são pinhas e estas estarão sempre ligadas ao “Lavrador”.

Note-se, como já foi falado anteriormente, uma das portas da cidade, a porta da corredoura e ainda, em frente ao chafariz encontramos uma parte da antiga muralha, que está protegida por uma parede de vidro.
Seguindo então por uma pequena travessa chegamos à Praça Duque de Wellington e que é largo por de trás da igreja de S. Pedro, contornamo-lo e entramos na igreja.

Igreja de S. Pedro:
A Igreja de S. Pedro é umas das mais antigas da cidade e sabe-se que já existia no reinado de D. Afonso Henriques, contudo, o edifício que vemos hoje é resultado de uma obra do séc. XVI e de uma nova reconstrução pós-terramoto de 1755.
O pórtico principal é de estilo manuelino e está coroado com as armas de D.ª Maria (a 2ª mulher de D. Manuel I) e a sua decoração naturalista é composta por uns elementos vegetalistas e outros zoomórficos (animais fantásticos) e ainda, junto ao tecto encontramos os atributos de S. Pedro, o patrono da igreja, a tripla tiara papal e as chaves do paraíso.
A capela-mor apresenta um altar seiscentista está decorado com talha dourada e as suas paredes estão cobertas por azulejos ponta de diamante e cercadura “dente de lobo” do século XVII. Separando a capela-mor do transepto está uma teia de torneados de pau-preto. Esta igreja é composta por três naves, separadas por arcadas, tem ainda altares colaterais: à esquerda há um altar dedicado a Nª Sr.ª da Conceição (onde a virgem aparece acompanhada pelos pais, S. Joaquim e Santa Ana) e do lado direito um altar dedicado à Santíssima Trindade. Ainda na nave esquerda encontramos o altar de Cristo Crucificado, enquanto que na nave direita está o da Sr.ª da Boa Hora. Quanto aos azulejos que cobrem a nave, estes são enxaquetados verdes e brancos do séc. XVI.

Seguimos em frente pela rua Miguel Bombarda, passando por algumas casas de estilo arte nova (uma delas é hoje um fotografo) e dirigimo-nos ao Largo do Município e aos Paços do Conselho, edifício que já foi a Câmara Municipal (hoje continua sob essa tutela) actualmente trata-se de um espaço de lazer e cultura, onde se realizam algumas exposições de arte, colóquios e é ainda um ciber café.
Passamos pela casa de chá “casa da avó Gama”, subindo pela rua Serpa Pinto. Esta é uma das ruas pedonais, onde encontramos edifícios mais antigos, algures construídos entre o final do séc. XIX e o XXI, e nela vamos encontrar uma pequena pérola torriense, algo escondida numa fachada simples. Trata-se da Igreja da Misericórdia. Este templo fazia parte do hospital, que se localizava no edifício ao lado.

Igreja da Misericórdia:
A Igreja da Misericórdia foi construída entre 1681 e 1710 para substituir a igreja do antigo hospital. Antes de entrarmos temos de passar por um pátio que já foi um dia o cemitério do hospital para os doentes mais pobres.
O portal é a introdução para a igreja barroca na qual podemos entrar. É decorado com concheados e com as armas reais de D. João V. A igrejinha tem uma só nave que é coberta por uma abóbada de berço e cujo tecto tem pintado o escudo de armas de D. João V. As suas paredes estão decoradas com azulejos do séc. XVIII de iconografia profana, do lado direito está um púlpito em talha dourada, ideologicamente sustentado por um atlante (representado nos azulejos) e do lado esquerdo está um cadeiral cujos lugares pertenciam aos elementos da Santa Casa da Misericórdia. Quanto à capela-mor, esta encontra-se separada do corpo da igreja por uma escadaria de mármore e é ricamente decorada com embutidos em mármore e talha dourada, assim como as capelas laterais.

Continuamos subindo e já regressámos ao ponto de partida. Estamos novamente na Praça da República, junto do Hotel Império, da Havanesa e do posto de turismo e, desta forma, terminamos a vista à cidade.
Espero que esta visita virtual vos tenha deixado com vontade de conhecer a cidade de Torres Vedras e, aos meus conterrâneos torrienses um sentimento de orgulho por viverem nesta tão agradável e afinal importante cidade.